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quinta-feira, 29 de agosto de 2019

REVIEW: Você vai curtir muito um fim de tarde com Time 'n' Place. Seu pai, não.



Talvez Time 'n' Place (2018), o segundo e mais recente LP de Kero Kero Bonito, não seja exatamente uma chaise long para se sentar e descansar em qualquer língua, a qualquer esperança. Há uma diligência necessária para apreciá-lo. Contudo, condiz teu nome ao demarcar um ponto de encontro para experienciar em comunidade (junto aos músicos) uma sensação.



Fabricado sem pontas ásperas, que a uma primeira vista com a capa remetente a uma "peculiar decoração do meu quarto" não parece ser real, sua encenação quer contrastar as exacerbadamente polidas imagens atribuídas ao KKB no passado, que de tão perfeitas acetinavam a irrealidade do conteúdo. Aqui, há uma humanização: um pensamento durante o banho sobre a morbidez de um dia, que toma corpo com cheiros e choros da gente. Justamente por isso, esse é o menos divertido álbum do agora quinteto, que assusta em trazer no caso uma qualidade. É a maturação (o desapego) necessária para chegarem próximos ao equilíbrio Aristotélicos dos gêneros que conduzem, não rígida à ideia punk-colorida do juvenilismo ilimitado.

A capa diz muito sobre muito. Diz tanto que é melhor nem ouvi-la falar. 🤷
A diminuição de tom toma as questões postas à mesa mais palatáveis, como um banquete curto de hambúrgueres e fritas, que são simpáticos ao momento sem o teor moral de uma refeição de casa. As letras pueris agarrando-se aos ritmos entrecortados e enjambrados demarcam essa profundidade, formando cicatrizes mais reais, que contam histórias com antes e depois, sob a vislumbrante e antética figuração de um presente-futurista com a cara dos anos 90, com pegadas do Red Hot Chili Peppers, Eminem e uma última brasa acesa do movimento hippie e beatnik nas mídias.

Só que essa bagunça sempre é terminada com os fiapos soltos queimados, tamanha a sutileza com que as músicas são encaixotadas para o álbum por transições perfeitas e contínuas, sem pecar no olhar moderno de uma construção voltada para a nova mídia em que ao trocar as partes, enfiá-las numa playlist ou numa ordem aleatória, ainda se mantêm coesas, contando a mesma história das mesmas pessoas, sem a necessidade de dobras corretas para fechar a gaveta.



Time 'n' Place assina um bom instante para se ouvir Kero Kero Bonito, um novo primeiro bom contato com o que têm a dizer, que não esquece da falta de responsabilidades da primeira juventude e complementa essa vivência com apontamentos mais cáusticos sobre a vida que está se formando - ainda que no fundo se recuse a parar; tal qual assola seu término abrupto ao recusar anunciar um fim. É uma ilustração meiga daquele que viveu muitos humores ansiosos e cortes de cabelo de uma vez só, em um lugar certo, em uma hora certa para ser, um dia, alguém.

Time 'n' Place (2018) 7,5/10
  Kero Kero Bonito | POLYVINYL RECORD CO. 
Há uma curva de fidelização unicamente por ser um disco contemporâneo (de estruturas, ritmos e formulações nouveaux) que talvez impeça o ouvinte tábula-rasa, acomodado ao que se fez clássico, de mergulhar no som. Mas não se engane: vale a ouvida até o fim! É uma bem-moldada porta sem paredes para conectar um apreciador de bons álbuns ao espectro de sublimação dos novos ritmos.

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