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sábado, 29 de agosto de 2020

2 marretadas por ano! A volta do BLACKPINK com a morna, derretida e melequenta Ice Cream (feat. Menina chora ao sentir a presença de Deus)


Independentemente de qualquer juízo de valor, Ice Cream é a pior das tentativas paridas ao mundo pelo BLACKPINK, que revela gritantemente as falhas construtivas do grupo. Pois não é apenas uma questão de atear fogo ao cd: as meninas continuam muito bem resolvendo o trabalho para que foram contratadas. Isso é o suficiente? Vamos descobrir.




A música pop norte-americana há tempos deixou de ser inventiva. Pra se ter uma noção, tirando atos visualmente alucinados (que a gente chama de inventivo e na verdade não se difere do resto que está sendo lançado), uma das últimas aparições divinas vindas da água foi a própria capanga desse lançamento: Selena Gomez.


Com o duo de singles Bad Liar e Fetish (feat. Gucci Mane), a cantora voltou com rimas sagazes, ritmos inusualmente interessantes (contrastando brilhantemente com vocais apáticos (que não se preocupe, não é uma crítica! Visamos aqui o estilismo da melancolia!) e o casamento destes com um trabalho artístico marcante: através da imagem, aumentar ou diluir os humores das peças. 

Essas proposições inteligentes foram eventualmente soterradas por cômicos mais-do-mesmo, que não devemos ao todo culpabilizar a artista: é a realidade encarada pelo mercado.

Tendemos a associar obras brilhantes da música pop moderna a dois pontos: os visuais que celebram e a potência vocal. Ao todo, é funcional que a música norte-americana seja resumida em seus posicionamentos, justamente para validar essas propostas. Ela tem de ser fácil de entender, consumir e replicar. Quanto mais digital e virtual a música se torna, mais a tendência de propostas curtas, simples e diretas ao ponto.

Isso por exemplo é uma das funcionalidades por trás das músicas de Ariana Grande e Victoria Monét, que participam da autoria de Ice Cream: com vocais soberbos, do miadinho à gritaria, o enfoque não precisa estar na estruturação do som.


BLACKPINK, de um lado mecânico, sempre esteve pensado para o mercado internacional. A ideia da YG Ent. esculturar por anos seus trainees para alcançar singularidade vocal está desde os primórdios da empresa, ao perceberem que duas das suas grandes cabeças, G.Dragon e Park Bom, transformavam água em vinho ao entregarem as músicas mais bolachas como refeições principais

No kpop essa realização se tornou tão importante (muito mais do que outras competências vocais) que empresas inteiras se fundamentaram sobre isso. É exatamente o motivo pelo qual BLACKPINK é tão reconhecível, mesmo entregando músicas de satisfação cada vez mais duvidosas. Não é um problema, é a própria solução.
 
O estoque de possibilidades é infinito quando o sucesso do trabalho (ou a qualidade da música) diz respeito à identidade das vozes compostas, como Rosé cantando com uma rolha na boca ou os versos de conversar com o gerente da Lisa: eles são ótimos e carregam o grupo

O histórico discográfico do BLACKPINK é uma anomalia. Começou realmente surpreendente, do mesmo jeito inovador que agraciava o 2NE1: forte, futurístico e barulhento. Talvez parecido até demais, que embora dividisse caminhos, trazia uma nostalgia e atenção ao grupo maiores que a sensação de plágio histórico. Era familiar, não apenas uma cópia.

Essa ideia sustentou-se bem, até mesmo com peculiaridades feito ressuscitar Forever Young, gravada tal e qual em 2015. A força de distinção era nítida - capaz de  incorporar essas reciclagens como produtos novos. O lapso que o grupo atualmente sofre (numa perspectiva crítica muito pessoal) está em, por dentro, na produção, tentarem reviver essas mesmas fórmulas e sons com esqueletos musicais modernos, mais próximos do mercado estadunidense, resultando em canções desgostosas e efetivas como Kill This Love e How You Like That.

Pequena crítica a How You Like That que condensa tudo o que aqui foi falado sobre o BLACKPINK: se a marca e identidade do grupo está inteiramente no estilo vocal, então pra quê tanto espaço vazio para admirar o instrumental de rave de buzina de bicicleta?

Elas ainda são e se parecem com o BLACKPINK. A marca é tão forte que se sobrepõe ao senso de inacabado que existe nessas músicas. A sensação é ainda mais evidente quando nos deparamos com um lançamento desse mesmo molde digital, Sour Candy, que ao invés oferece cores e ideias bem estruturadas. Não é de forma alguma uma música revolucionária. É pop. Contudo está atenta às pessoas envolvidas, à intenção de ser dançante, sinestésica e coexistente com todas as personalidades vocais sobre o instrumental. 

Sour Candy é, muito bem, pensada para as pessoas ali habitadas, o que não é o caso de Ice Cream. Ela não soa como uma música de Selena Gomez, do BLACKPINK sequer. Talvez porque de um lado temos nenhuma identidade sonora marcante (com muitos acertos e muitos afogamentos num bueiro aberto) e do outro temos muita personalidade, que até consegue sair ilesa no tiroteio, embora não reflita nem de perto o que a música peça (ou consegue se igualar aos baixos que a música sofre): não é apenas a personalidade que precisa sobressair. Exige também variedade.


Vale a pena pegar MONOPOLY, das já citadas pintoras Grande e Monét, como comparação: o instrumental na cama de UTI dá espaço para que a projeção vocal impecável e suas modulações ganhem holofote. As duas conseguem preencher a música e fazer toda a corrida de montanha-russa para te levar até o final. Coisa que nunca foi uma preocupação para o BLACKPINK, especialmente não exigido no já formulado mercado fonográfico coreano. Enquanto são todas competentes, só três integrantes trabalham na música por fluência no inglês (o que nos faz perguntar: por que não um verso em coreano ou um bibidi bobidi bu pra encher o espaço da Jisoo?). O resto é representado por Selena, que também não é - e não é aqui que pôde demonstrar - uma experiência vocal com notas proeminentes, melismas e uma boa gritaria.

Tudo soa horrivelmente patético, mas funcional no que se propõe: ser uma música rasa que vai vender horrores. Não é uma questão de gosto. Goste se quiser. Todavia não balança o nosso mundo. Não soa como algo gigantesco e imprescindível que deveria ser para o já então chamado maior grupo feminino da atualidade.

Vamos celebrar o BLACKPINK! Um grupo essencial com músicas tenebrosas que representam com exatidão e sucesso onde o kpop desde sempre quis chegar. 

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