Dar continuidade aos detalhes do projeto aespa é um acontecimento
de extrema sensibilidade para o público, dado que para poucos
importa o desenvolvimento das ideias diegéticas (isto é: do
mundinho criado) como Black Mamba, KWANGYA e nævis. Na verdade, se
fecharmos os olhos o suficiente para enxergar tudo borrado, dá pra
entender o principal motivo: cavaram a própria cova ao tentarem
interligar tudo num universo coeso, coisa besta que já estava lá e
não precisada ser mexida pela alegoria muito inteligente da estação
SM, com diferentes paradas para acessar seus grupos e vez ou outra
abrindo rotas para interligar a outros artistas de outras empresas e
outros próprios universos corporativos.
Abrindo os olhos
novamente, pode-se fingir enganado que isso foi feito para o público.
Que felicidade! O projeto não foi abandonado mesmo que os produtores
já não sejam os mesmos e sequer estejam associados aos seus
patrícios, vista a confusão dos últimos anos que têm sido as
entranhas daquela empresa. Não somente, tecnologia e inteligência
artificial são temas reverberantes como chicote (e mesmo aqui abaixo
voltarão para serpentear um ataque): em mais de um século literário
e acadêmico sobre transhumanidade, pouco se pescou de despreocupado
e divertido. Tende-se sempre a mergulhar em questões profundas da
ética e da moralidade, o que aparece junto às decisões muito
suspeitas de direção criativa do grupo para manchar quaisquer
lançamentos. Nas tentativas fora da comuta tecnológica, o mesmo
sucesso esperado pela ansiedade tecnológica foi encontrado, sem
palpitar para qualquer controvérsia. O futuro é assunto para lá de
legal, mas quanto mais absorto de qualquer lógica funcional e
contínua, melhores são os resultados.
Tudo isso descrito é uma boa abertura para quem aqui se analisa. Não o grupo e não aespa, contudo a Virgem Maria da história, nævis. Enfim saiu das menções e participações para ganhar corpo, trazendo para nós imenso mau gosto.
Done é o lançamento fixo da personagem, que até então era um set de aparições feito sustos num filme de terror. A música, acompanhada de clipe, veja por si só, é ruim. Tudo envolvido é ruim, e cabe aqui, sentados comigo, discutir o porquê.
Diferentemente do que aespa já fez e já comentamos, não dá para separar uma criação cuja premissa é “inteligência artificial construída da absorção de informações do mundo real, com o desejo de ingressá-lo.” da tecnologia. Pensemos em toda a amplitude que isso possa arquitetar, valendo-nos desde o senso comum até as criações artísticas (podendo citar: Blade Runner, Neuromancer, Matrix…) que ilustram nosso imaginário cultural cibernético. O que Done apresenta é o extremo oposto, o da redução. Em vez de explorar as possibilidades que o digital e o robótico possam trazer, desde músicas ultravelozes a coreografias com piruetas dignas de uma competição de ginástica artística, pela extrema facilidade do “não-real” posto em jogo, temos o realístico do artificial. Música morna dublada por um Facemoji que move os braços por uma cidade inabitável.
É apenas isso o que ganhamos?
Sejamos justos: faz sentido para o mundinho KWANGYA? Claro, se ela coleta “informações do mundo real”, então parece ser ideal que uma porcentagem absurda seja feita por músicas de canal de gameplay de Minecraft e cantores sem charme. Agora, isso não é tudo o que há. Se temos criações experimentais e fora da caixa, mesmo no grupo base de onde saiu nævis, é desmerecedor que esta venha com uma tora mofada bater em seu público. Mesmo o sentido diegético perde sua função, pois o mundo real não é o genérico e nem é do genérico que se construirá uma boa narrativa.
Todo o resultado parece indistinto, colapsando com as roupas de luxo e alta performance visual que vestem os trabalhos da SM Entertainment. Sairíamos menos confusos se dissessem que esse é um dos solos sazonais da Wendy ou uma trilha sonora indistinguível para novela do Netflix, o tipo de coisa generativa feita para ocupar espaço.
Done (2024) - nævis | SM Entertainmentprós.: deu continuidade à narrativa do aespa.
cons.: conceito ruim - execução ruim - tudo ruim.
★☆☆☆☆ 1/5
👎
Querem um contraste muito interessante? Muito falo sobre essa obra (especificamente o álbum que até mesmo foi ponto de partida para um artigo meu sobre inclusão autoral da técnica na obra de arte), então não discutirei suas minúcias aqui, todavia dá para fazer uma síntese: do visual ao uso estimulante da tecnologia no som para ampliar tanto as capacidades vocais do coro como a fim de trazer estruturas inesperadas para a faixa, Eternal traz uma incrível navegação entre o humano e o técnico. Vale o embate, cortando a jugular num susto com faca.
Eternal (2019) - Holly Herndon | 4AD Ltdprós.: apoio tecnológico para complementar o humano.
cons.: vamos fingir que a relação da artista com a IA ficou presa em 2019 feito o Inuyasha na flecha.
★★★★★ 5/5
👍
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