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quinta-feira, 27 de setembro de 2018

REVIEW: mesmo com todos os problemas de sempre, Japamyu segue como um dos lançamentos mais divertidos de Kyary Pamyu Pamyu

Do surpreendente alarde de definhar o cenário pop japonês pelas crias de Yasutaka Nakata, nessa quarta-feira, dia 26, o quarto e tão polêmico álbum de Kyary Pamyu Pamyu arrebentou as barragens da internet para atiçar o fogaréu das fãs póstumas do estilo acumulador do DJ. Com toda a reflexão das últimas semanas, pudemos lavar as mãos e aceitar os benefícios desse seu momento displexo. Contudo, a dúvida não foi sanada: o novo som homeopático do produtor trouxe alguma melhoria para a tralha discográfica da sua menina-dos-olhos?

Apesar das confabulações de novidades estruturais no trabalho de Nakata, o resumo é que a menor mudança já seria positivamente abarcada na trajetória hit & miss de LPs de Kyary, que se comprimem na tênue linha de uma obra singularmente harmônica e um aparato de estoque dos singles semestrais jogados a rodo. Suas últimas propostas (o magnificente Pika Pika Fantajin (ピカピカふぁんたじん) e, risos, a legítima coletânea KPP Best), um vão de sons irreconhecíveis e inconciliáveis aguardava uma curadoria para ser imaginado num mesmo CD.



Por conta disso, o dedinho de editor que passou com pressão em COSMIC EXPLORER (visto às brisas em REVIEW: Future Pop medita com sinceridade sobre o futuro de Perfume - e da música mainstream global) era esperado de dar as caras para lixar as arestas rústicas entre canções. O enlace esteve em Future Pop, lançamento seguinte, não conter muitas remixagens para álbum, mas também não ter muita disparidade sonora. Isso era exceção da fórmula e Japamyu (じゃぱみゅ) requisitaria - e traria consigo - uma série de limitantes para pôr as sentenças num mesmo vernáculo. Por conseguinte, receber o álbum praticamente cru foi um primeiro encontro ao que linguisticamente não parecia correto - e repetia o erro de sua estreia com Pamyu Pamyu Revolution (ぱみゅぱみゅレボリューション), do qual o nome de arregaçar as pernas da comodidade se fazia fraco por, na prática, ressonar um desequilíbrio entre as faixas-guia e os preenchimentos do álbum.

Aqui, igualmente, os singles contrastam brutalmente às canções originais, maquiavelicamente tornando a obra vulnerável a críticas possivelmente injustas: no que se propôs à didática oriental e menos pamyumesca de Kyary, Japamyu é um dos esforços mais divertidos e despretensiosos da artista.

Parte 1. Nakata homenageia Nakata em álbum composto por Nakata para Nakata - e por incrível que pareça, isso é muito Kyary.

CAPSULE começou com um som derivativo do bairro Shibuya (interligue-se: de Harajuku para a construção de Kyary à Shibuya para Nakata, a geografia urbana é muitíssimo importante no curso musical japonês), que flertava com o jazz, o kitsch e a eletrônica. Sua transição para uma apoteose house em FRUITS CLiPPER, no entanto, é uma adaptação natural das experimentações vindas em sua primeira fase com a vocalista Toshiko Koshijima.

Na introdução do primeiro álbum da dupla, High Collar Girl, lidamos com uma versão obsolescente e digital do Japão festivo, carregado de um chiptune a conta-gotas, lembrança significativa para conectar que esse álbum tão sóbrio é da mesma mente que tirou do bolso, sete anos depois, o pancadão dancepop esquizofrênico e.d.i.t. O estilo de Japamyu costura maravilhosamente essa memória celebrativa de Samurai Logic (que em alma se revela dando olás em nativas feito Oto no Kuni (音ノ国)), com a metáfora cômica de denominar o primeiro ponto do álbum de Virtual Pamyu Pamyu (バーチャルぱみゅぱみゅ): a seleção estórica (sic) de Kiriko em uma primavera pixelada da Tóquio retrofuturística.



Os vocais são moldados menos plasticamente que em todo o catálogo de Pamyu (o mais próximo sendo em Furisodation (ふりそでーしょん), também explorativo do tema da adultificação): uma voz mais natural aos estranhos e cartunescos agudos da vocalista que impropriamente some por camadas rudes de vocoder e autotune durante os singles (do tipo que faz Kimi no Mikata (きみのみかた) aparentar uma propaganda da OMO entre os programas da rede de tevê aberta) e só se encontra novamente no quasi-interlúdio Enka Natrium (演歌ナトリウム). É um material muito curto de trabalhos específicos, que são despontantes em múltiplos sentidos estruturais para o círculo estranho de lançamentos da última tríade de vivência da cantora (por si um sumiço desconfigurante dos moldes maquinários do espaço fonográfico) e revivem essa necessidade de se mudar por completo para manter relevante.

A falta do hábito não deixa de perder ao todo sua assinatura sonora, reavaliada no descanso com que esses novos vislumbres foram distribuídos em torno das músicas. O uso de respiros, samples comentados e um banho de rap capaz de colocar Kero Kero Bonito e WEDNESDAY CAMPANELLA em seus devidos lugares, sem em algum momento pedir pelo combate, passam por um filtro de deboche divertido que traz prazer de ouvir o disco numa tacada só.

Se muitos dos trechos de Future Pop pareciam um desafio satírico à visão estadunidense do Japão em gigantescas cenas do Speed Racer das Wachowski, as mãos do produtor elevaram a retórica contemplativa ao pegar essa visão toda e liquefazer com o paradoxo western oriental, vigorando a outra ultrarrápida e memorável corrida dos 90s pela OST de Top Gear. Este sendo o menor álbum de Kyary, contudo, faz restar a sensação agridoce de um modelo seguro demais para tentar deslanchar alguma nova faceta na carreira, apesar de tamanho autorialismo por detrás da confecção. A justificativa contém, entretanto, questionamentos ocidentais que não fazem muita diferença no marketing local, do qual grande parte da positividade da terraplanagem das músicas - que evitam de tornar a sessão uma espécie de tortura - está na coesão entre as peças e também no teor EP-ístico por trás de Japamyu.

Parte 2. Curto demais, Japamyu se entrega como o que é bom, não o que é insuficiente.

A organização de singles e faixas-títulos tem muito mais importância no motivo da compra em um mercado predominantemente físico, que não foi assolado com totalidade pelas medidas hodiernas do cenário digital. Portanto, o posicionamento estratégico de melodias já conhecidas beneficiam a leitura e assimilação do conjunto todo e o que vier preenchendo as lacunas é na maior parte das vezes compreendido como bônus quantitativo.


Como consequência, temos uma decepção elaborada vinda do lado de cá, por gente não instaurada desde cedo nos formatos desse mercado peculiar. A capa simplista, a infusão de A e B-sides lançadas há mais tempo e o modismo anunciado não são apetitosos para nós - derradeiros da unidade sonora, sem atender fluentemente às metáforas linguísticas, política e essência do nicho - como são para o público que acompanha a imagem da ídolo na tevê, reconhece os designs e conceitos de Mitsuo Shindo para arquitetar a porta da frente da etapa vigente e faz questão de comprar múltiplos boxes pela possibilidade de ter um jantar com a artista. O desapontamento é ainda mais peculiar pela sutileza com que essas mudanças foram trabalhadas, ao que muitos esperavam um choque de valores como na aclamada sessão de fotos para Numéro Tokyo, de 2016, em que a gurizinha incorporou sua Cléo Pires interior.

As incógnitas se tornam bastante complexas no instante em que - global e multimídia - a razão do público internacional não deve ser exaurida ou tampouco a culpa deve ser atribuída para a fanbase. A impressão negativista sobre a duração do álbum e a estética criada caem com peso na formulação dos artigos subsequentes, numa interpretação inconsistentemente local de problemas gerais. Essa é uma das inconciliáveis barreiras que impedem a expansão mundial de participar ao seu tratamento. A excessiva manchete de uma reestruturação completa foi trabalhada por modus de controle de dano, em que a carreira geral de Kiriko não foi linear ou hermética o suficiente para desafiar-se num precipício filosófico. Ou seja, o burburinho foi isolado quando os singles não necessariamente serviram de preparação para essa mudança anunciada, conjurando nada mais que a Pamyu de sempre.

Com Japamyu, o episódio da rápida, certeira e ilimitada diversão é guardada nas medidas de segurança da montagem do disco, enganchado pela nostalgia de Nakata ao reviver o início de sua carreira mainstream em High Collar Girl - pelos riffs sintéticos ao cover modernizado de Koi no Hana (恋ノ花) -, no qual o caráter enxuto de EP por um triz, sem nunca perder o pique, consome o desânimo e apimenta com inocência a voracidade de ouvir um pouco mais dessa versão de Takemura Kiriko, que esperamos, depois de tão longe e com tantas conquistas, continuar no ápice de sua aparição meteórica.

Japamyu (2018) - Kyary Pamyu Pamyu | WARNER MUSIC JAPAN 
prós.: clima interessante + kyary rapper assolando nações + divertido
cons.: muito curto - singles perdidíssimos - tracklist duvidosa
faixas sugeridas: Oto no Kuni (音ノ国), Chami Chami Charming (ちゃみ ちゃみ ちゃーみん), Enka Natrium (演歌ナトリウム)

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