Apesar das confabulações de novidades estruturais no trabalho de Nakata, o resumo é que a menor mudança já seria positivamente abarcada na trajetória hit & miss de LPs de Kyary, que se comprimem na tênue linha de uma obra singularmente harmônica e um aparato de estoque dos singles semestrais jogados a rodo. Suas últimas propostas (o magnificente Pika Pika Fantajin (ピカピカふぁんたじん) e, risos, a legítima coletânea KPP Best), um vão de sons irreconhecíveis e inconciliáveis aguardava uma curadoria para ser imaginado num mesmo CD.
Por conta disso, o dedinho de editor que passou com pressão em COSMIC EXPLORER (visto às brisas em REVIEW: Future Pop medita com sinceridade sobre o futuro de Perfume - e da música mainstream global) era esperado de dar as caras para lixar as arestas rústicas entre canções. O enlace esteve em Future Pop, lançamento seguinte, não conter muitas remixagens para álbum, mas também não ter muita disparidade sonora. Isso era exceção da fórmula e Japamyu (じゃぱみゅ) requisitaria - e traria consigo - uma série de limitantes para pôr as sentenças num mesmo vernáculo. Por conseguinte, receber o álbum praticamente cru foi um primeiro encontro ao que linguisticamente não parecia correto - e repetia o erro de sua estreia com Pamyu Pamyu Revolution (ぱみゅぱみゅレボリューション), do qual o nome de arregaçar as pernas da comodidade se fazia fraco por, na prática, ressonar um desequilíbrio entre as faixas-guia e os preenchimentos do álbum.
Aqui, igualmente, os singles contrastam brutalmente às canções originais, maquiavelicamente tornando a obra vulnerável a críticas possivelmente injustas: no que se propôs à didática oriental e menos pamyumesca de Kyary, Japamyu é um dos esforços mais divertidos e despretensiosos da artista.
Parte 1. Nakata homenageia Nakata em álbum composto por Nakata para Nakata - e por incrível que pareça, isso é muito Kyary.
CAPSULE começou com um som derivativo do bairro Shibuya (interligue-se: de Harajuku para a construção de Kyary à Shibuya para Nakata, a geografia urbana é muitíssimo importante no curso musical japonês), que flertava com o jazz, o kitsch e a eletrônica. Sua transição para uma apoteose house em FRUITS CLiPPER, no entanto, é uma adaptação natural das experimentações vindas em sua primeira fase com a vocalista Toshiko Koshijima.
Na introdução do primeiro álbum da dupla, High Collar Girl, lidamos com uma versão obsolescente e digital do Japão festivo, carregado de um chiptune a conta-gotas, lembrança significativa para conectar que esse álbum tão sóbrio é da mesma mente que tirou do bolso, sete anos depois, o pancadão dancepop esquizofrênico e.d.i.t. O estilo de Japamyu costura maravilhosamente essa memória celebrativa de Samurai Logic (que em alma se revela dando olás em nativas feito Oto no Kuni (音ノ国)), com a metáfora cômica de denominar o primeiro ponto do álbum de Virtual Pamyu Pamyu (バーチャルぱみゅぱみゅ): a seleção estórica (sic) de Kiriko em uma primavera pixelada da Tóquio retrofuturística.
Os vocais são moldados menos plasticamente que em todo o catálogo de Pamyu (o mais próximo sendo em Furisodation (ふりそでーしょん), também explorativo do tema da adultificação): uma voz mais natural aos estranhos e cartunescos agudos da vocalista que impropriamente some por camadas rudes de vocoder e autotune durante os singles (do tipo que faz Kimi no Mikata (きみのみかた) aparentar uma propaganda da OMO entre os programas da rede de tevê aberta) e só se encontra novamente no quasi-interlúdio Enka Natrium (演歌ナトリウム). É um material muito curto de trabalhos específicos, que são despontantes em múltiplos sentidos estruturais para o círculo estranho de lançamentos da última tríade de vivência da cantora (por si um sumiço desconfigurante dos moldes maquinários do espaço fonográfico) e revivem essa necessidade de se mudar por completo para manter relevante.
A falta do hábito não deixa de perder ao todo sua assinatura sonora, reavaliada no descanso com que esses novos vislumbres foram distribuídos em torno das músicas. O uso de respiros, samples comentados e um banho de rap capaz de colocar Kero Kero Bonito e WEDNESDAY CAMPANELLA em seus devidos lugares, sem em algum momento pedir pelo combate, passam por um filtro de deboche divertido que traz prazer de ouvir o disco numa tacada só.
Se muitos dos trechos de Future Pop pareciam um desafio satírico à visão estadunidense do Japão em gigantescas cenas do Speed Racer das Wachowski, as mãos do produtor elevaram a retórica contemplativa ao pegar essa visão toda e liquefazer com o paradoxo western oriental, vigorando a outra ultrarrápida e memorável corrida dos 90s pela OST de Top Gear. Este sendo o menor álbum de Kyary, contudo, faz restar a sensação agridoce de um modelo seguro demais para tentar deslanchar alguma nova faceta na carreira, apesar de tamanho autorialismo por detrás da confecção. A justificativa contém, entretanto, questionamentos ocidentais que não fazem muita diferença no marketing local, do qual grande parte da positividade da terraplanagem das músicas - que evitam de tornar a sessão uma espécie de tortura - está na coesão entre as peças e também no teor EP-ístico por trás de Japamyu.
Parte 2. Curto demais, Japamyu se entrega como o que é bom, não o que é insuficiente.
A organização de singles e faixas-títulos tem muito mais importância no motivo da compra em um mercado predominantemente físico, que não foi assolado com totalidade pelas medidas hodiernas do cenário digital. Portanto, o posicionamento estratégico de melodias já conhecidas beneficiam a leitura e assimilação do conjunto todo e o que vier preenchendo as lacunas é na maior parte das vezes compreendido como bônus quantitativo.
As incógnitas se tornam bastante complexas no instante em que - global e multimídia - a razão do público internacional não deve ser exaurida ou tampouco a culpa deve ser atribuída para a fanbase. A impressão negativista sobre a duração do álbum e a estética criada caem com peso na formulação dos artigos subsequentes, numa interpretação inconsistentemente local de problemas gerais. Essa é uma das inconciliáveis barreiras que impedem a expansão mundial de participar ao seu tratamento. A excessiva manchete de uma reestruturação completa foi trabalhada por modus de controle de dano, em que a carreira geral de Kiriko não foi linear ou hermética o suficiente para desafiar-se num precipício filosófico. Ou seja, o burburinho foi isolado quando os singles não necessariamente serviram de preparação para essa mudança anunciada, conjurando nada mais que a Pamyu de sempre.
Com Japamyu, o episódio da rápida, certeira e ilimitada diversão é guardada nas medidas de segurança da montagem do disco, enganchado pela nostalgia de Nakata ao reviver o início de sua carreira mainstream em High Collar Girl - pelos riffs sintéticos ao cover modernizado de Koi no Hana (恋ノ花) -, no qual o caráter enxuto de EP por um triz, sem nunca perder o pique, consome o desânimo e apimenta com inocência a voracidade de ouvir um pouco mais dessa versão de Takemura Kiriko, que esperamos, depois de tão longe e com tantas conquistas, continuar no ápice de sua aparição meteórica.
Japamyu (2018) - Kyary Pamyu Pamyu | WARNER MUSIC JAPAN
prós.: clima interessante + kyary rapper assolando nações + divertido
cons.: muito curto - singles perdidíssimos - tracklist duvidosa
faixas sugeridas: Oto no Kuni (音ノ国), Chami Chami Charming (ちゃみ ちゃみ ちゃーみん), Enka Natrium (演歌ナトリウム)
Nenhum comentário:
Postar um comentário