Na internet, juram em bordar nas mangas que o novo single de Weki Meki é uma vitória. Bem, talvez essa seja uma afirmação muito pretensiosa, em que o grupo continua numa plataforma desnivelada da série de coitos interrompidos de decisões empresariais. Com muito potencial escondido - inclusive em Crush -, o césio radioativo pós-IOI prossegue com decisões sonoras ousadas, contemporâneas e, acredite: embaladinhas nos pacotes mais arcaicos possíveis.
A discografia de Weki Meki sofre de um cronismo problemático em torno de um som temporalmente presente arquitetado em um modelo clássico estipulado na geração passada do kpop. Assustadoramente, o mesmo problema se repete desde o debute no ano passado com I don't like your Girlfriend, a peça chave - e sapo formalmente dissecado neste artigo - para compreender os hematomas de um corpo tão noviço.
O grupo foi construído numa verdadeira colcha de retalhos dos muitos acertos dos conjuntos-irmãos vindos da primeira temporada do reality show Produce 101 que, de retórica absurda, revolucionou o jogo por melhor ou pior ao parir freneticamente uma multidão de gente para o duelo impiedoso da mídia coreana. Para resistir, era necessário enganar o público com ideias vacantes de originalidade, sob as quais a produtora fantagio Co. lapidou um monstro de Frankenstein incapaz de tomar afinidade a alguém.
Nota: antes de começar o corpo do texto, preciso assertar que muitas dessas ideias são de meu imenso agrado, dotadas de criatividade e valentia, cujo brio se apagou por maus, corridos e desesperados movimentos corporativos que revelam, sobretudo, o desconsolo que motiva muitas das colocações aqui presentes, ao invés da perspectiva comum de ira gratuita.
Parte 1. Os fantasmas do passado assolam brigas continentais:
Weki Meki coerentemente carrega nas trouxas o estilo moderno e fragmentado ao qual as pequenas (e crescentes) tentativas no espaço sonoplástico geraram juízos polarizados e muita promessa sobre o caráter vanguardista que têm. O que soa como um soco no olho declara também o impacto que trazem à mesa de jantar já preenchida pelas muitas aparições vindas do finado programa e distancia elas de quaisquer massas generalistas já estabelecidas... Da pior forma imaginável.
Enquanto parece um problema da construção peculiar da música, a crítica enjambrante pode ter raízes ainda mais fortes na parceira de crime do kpop: o apoio visual. A unânime beleza e técnica das câmeras asiáticas perde a intenção numa estrutura narrativa desequilibrada, daquele ritmo que por algumas décadas foi aperfeiçoado para chegar nos contemplativos e tonais videoclipes do arco 2K10.
Como numa aula de roteiro, a melhor forma de entender os transtornos de uma peça é se aproximar às semelhantes que sucederam ou falharam em apreciar o televidente. Se I don't like your Girlfriend encara as duas acusações - o sabor fresquinho de 2017 em camadas que imitam essa obsolescência da outra era -, nada mais plausível que puxar um de cá e um de lá para justificar nossas conclusões.
Como numa aula de roteiro, a melhor forma de entender os transtornos de uma peça é se aproximar às semelhantes que sucederam ou falharam em apreciar o televidente. Se I don't like your Girlfriend encara as duas acusações - o sabor fresquinho de 2017 em camadas que imitam essa obsolescência da outra era -, nada mais plausível que puxar um de cá e um de lá para justificar nossas conclusões.
I GOT A BOY
A fissura de ânimos I GOT A BOY é um dos grandes competidores na divisão da discografia quase unânime do espetáculo da nação Girls' Generation. Num caso de brilhantismo que transbordou as comportas do aceitável, não somente é uma música irregular ao previsivelmente dinâmico estilo das garotas como agrega múltiplas camadas de conflitos não resolvidos - entre o som, a letra e o visório.
Para tratar o descompasso à figura conhecida, a intenção não estava em revolucionar as barreiras ou adicionar uma modular sonora fresca ao arquivo da equipe, porém na possibilidade de brincar com a seriedade das integrantes, em que a complexa estrutura da música contém um jogo meio maldoso (de um modo "maneiro") para prolongar - ou diz-se até mesmo reiterar - as céticas tentativas prévias em Run Devil Run e The Boys. Inevitavelmente, que reflete numa ingenuidade proposital, essa quebra de normalidade linguística e afetiva é demonstrada através de antíteses diegéticas visuais, do cartunesco - recheado de onomatopeias, comic sans e balões de pensamentos - Girls' Generation amoroso ao hip-hop-swag-girl-crush com tiras rasgadas de couro, camuflagens e tachas pontiagudas.
Embora a música não seja uma colher de chá para todos, a parte qualitativa é indiscutivelmente bem elaborada (a passagem de gêneros por notas equivalentes, a icônica conversa intertextual "Don't stop, bring it back to 140", referente à seção 1:40 da faixa e ao bpm nesse instante). O design sonoro, contudo, é um processo múltiplo a ser provado, do instante em que não pertence ao esperado desfecho musical da maior parte de músicas pop. Isso tudo comprimido num período limitado de tempo faz com que o trabalho total - e entendemos nisso o clipe como órgão atado do tipo de comércio estabelecido no cenário Hallyu - exija um balanceamento de forças que é esteticamente ignorado no produto final.
O vídeo de I GOT A BOY possui informação agregada em todas as particularidades possíveis de se definir, no qual pequenas estórias autossuficientes digladiam para aparecerem em tela, sem nunca obterem seu escape e sequer dando motivos para estarem ali além de enfatizar os muitos gêneros musicais amontoados. É, indignadamente, uma impressão de poluição visual que apesar de afagado pela fama monolítica do grupo, criou burburinho suficiente para soltar uma névoa de anti-fanatismo ao single.
A partir da introdução não-resolvida ao acúmulo de vestimentas e cenários abatidos por luzes, ambiências, textos e padrões, o filme consegue se perder ainda mais nos tempos de respiro das transições, que são moldadas em efeitos próprios que as irrompem em verdadeiras cenas - e tiram a premissa de interligarem ou dividirem as fatias do todo. Se as porções são empilhadas, sem nunca obterem elucidação para as pistas, é criada a sensação de se andar vertiginosamente por muitos quilômetros sem chegar a lugar nenhum, que não é um sentimento otimista para uma canção individualmente labiríntica, com respectiva necessidade de atenção.
Love Cherry Motion
Sendo a regra desse cenário envelhecido, I GOT A BOY mantém sua relevância enquanto associada aos sucessos alcançados por seu uso, mesmo que não parta de um discernimento por causalidade. Love Cherry Motion, o epilético solo da oitava integrante do fervilhado LOONA, em outra vez, é novilho idealizado e exercido nessa recente configuração de linguagem, por uma direção que muito ajudou nesse formato.
Com a felicidade do dinamismo do texto (em que a imagem faz parte), seu sucesso também representa um padrão - ou seja: uma regra! -, numa diferente parcela do tempo. O equilíbrio recomendado à música dialeticamente inusitada é encontrado na limitação dos recursos totais exibidos no videoclipe, em que existe um único roteiro separado por intensidades gráficas: na porção recreativa da canção, é iniciada uma trama que segue a decoupagem clássica do cinema, com início, meio e fim; cortes secos e um suporte em torno do fluxo de velocidade dos acontecimentos, organizado pela aceleração e diminuição do ritmo musical. O break é inaugurado por um contraste de matizes, em que a claridade da cena anteriormente apresentada - a caixa branca onde acontece a coreografia - é substituída por um feixe de luz púrpura.
No próprio senso da quebra de um ritmo, a pausa é um dos clímax da estória, que pela curta aparição toma para si também o espectro de ser instigante o suficiente - o notável efeito cliffhanger - para especular o que vai acontecer a partir daí, bruscamente cortado para um estado anterior. A inteligência de direção de DIGIPEDI está em delicadamente ir mesclando as antíteses imagéticas para convalescer num desenlace que apresente harmonia entre as polaridades apontadas, com as camadas de clareza e iluminação (tons amenos de branco e azul nos espaços vagos) sendo sobrepostas por porções sólidas de cor, feito o muro verde de árvores que cobre metade do céu que clareia a sequência.
Uma mesma experiência é encorpada progressivamente para fechar o clímax e desencadear o epílogo, do campo em que as extremidades chegam a um consenso representado pelos panoramas previamente retratados injetados por tons roxos unicamente naturais à diegese. O observador, sem convalidar com profundidade cada detalhe construtivo dos planos declarados, entende instintivamente o ciclo e seu término, cuja facilidade de interação compensa a necessidade reflexiva do paralelismo experimentado na melodia.
Parte 2. Pouxa croushe por que não me notas?
Justificar um balanço de unidades para esclarecer o conteúdo torna entendível o porquê de boa parte da reprimenda a I don't like your Girfriend vir da impressão estética que não complementa proveitosamente seus caroços alternativos. O que exige o efeito âncora se deteriora na instantaneidade de seu lançamento e não se resolve de forma alguma nas sequências La La La e Crush - que são reduzidas a graus de mediocridade em oposição a trabalhar com mais franqueza nas singularidades ofertadas no debut.
A segunda faixa-título, por exemplo, é imensamente desorientada a qualquer competição sonora moderna, em que poderia cegamente ter saído da discografia (e videografia) do anulado HELLOVENUS. Crush, da mesma maneira, retorna nesse paradoxo da identificação por raspagem, que a apreciação positivista do público talvez mergulhe num reconhecimento pelas semelhanças intimistas a timbres conhecidos: de uma mescla inexpressiva entre DDU-DDU-DDU, AS IF IT'S YOUR LAST - de BLACKPINK -, ..., e Roller Coaster - de CHUNG HA.No benefício da dúvida, o lead acaba por retomar um certo grau confortável de saída-da-caixa e peca histericamente ao conferir uma visualidade regressiva em seu suporte fílmico, no qual uma bola de neve rompe em avalanche com esquetes cômicos que soam mal formatados com a temática séria que pincela a história. Mais do que isso, é uma mensagem visual difícil de ser levada a sério, em que simbolismos de violência são tópicos sinuosos de serem trabalhados, politicamente inconveniente de ser elaborado num linguajar caricato.
(Parênteses)
Falar de delicadeza tonal é um ótimo gancho para se notificar que quaisquer conversas esquadrinhadas aqui devem ser visualizadas com pitadas de sal, ao que há muita contradição dialética ao meu torno enquanto autor. Para começar, dialogar sobre sensos politicamente permissíveis - ou seja, como a semiótica encara os signos antepostos - auto-executa uma hipocrisia do título deste artigo metaforizar satiricamente os diálogos sobre neofascismo e defensoria do uso de armas de fogo que permeiam a relevância dos assuntos discorridos em nosso país.
Não havendo defesa para isso, gostaria de salientar que todas as opiniões - contrastes, brincadeiras, erros e acertos - contidas aqui no blog pertencem unicamente à minha visão integral, que não deve ser diminuída ou negligenciada. Sobretudo, uma piada de humor tão fúnebre deve ser encarada com exame reprovativo, que enquanto ofensiva pode ser abertamente discutida comigo pela seção de comentários ou abolido em geral por minha metodologia de escrita.
Além disso, alguns dos motes que serão revelados a seguir incluem discussões sobre emblemas feministas, às quais, como cis gênero masculino, não possuo opinião majoritária ou vivência para articular com sabedoria de causa. Os apontamentos, contudo, têm base em análises comuns à narrativa da obra. Quaisquer retratamentos e retificações estão abertas, ao que a interação leitor-autor é extremamente bem-vinda para construir minhas opiniões e expressões públicas sobre as diversificadas teses expostas aqui. (parênteses)
O ritmo passivo-agressivo é incapaz de levar a altas amplitudes as matérias assumidas, que passam a concordar com uma interpolação anti-feminista pela contraposição dos arquétipos de força e inteligência (o manuseio dos armamentos, a quebra e controle de dados computacionais etc.) por estereótipos degradados de feminilidade, exportado na hesitação, fragilidade e receio posterior ao uso dos mecanismos hostis.
Tal estigma confere uma noção constantemente centrifugada na sociedade coreana, que sequer é amigável ao âmago subversivo apropriado por Weki Meki desde sua formação. O lirismo em I don't like your Girlfriend é atônito à apreensão geral da cultura patriarcal do país, que a uma retratação ampla, infere na fortificação de uma voz contra-corrente dessa margem. Ela implica, também, a necessidade de repetição para obter normatização, ao qual difere de se apropriar de outras indisciplinabilidades por valor de choque. A limitação de um discurso, sobreposto a conspiratas rebeldes - politicamente incorretas à visão comum - apela a uma acepção desvalorizada do produto.
Nessa contiguidade, o conjunto demanda uma familiarização de imagem nos variados horizontes de autenticidade, globalmente estruturados nas composições visuais que serão exibidas e rememoradas socialmente. Estabelecer um grupo está muito além da colagem de tendências e da fama individual de suas integrantes: o produto de segunda escala, inconscientemente, é interpretado em um plano suplementar na matriz do espectador. À fantagio Co., falta uma malícia na elaboração de motivos que consolidem a carreira das garotas, que minuciosamente entendemos pelos próprios percalços de ser uma empresa mediana na rinha faminta do mercado.
Ao invés de se apoiar nas muletas miméticas dos grandes acervos econômicos, talvez seja a hora da produtora encarar o cenário por idealizações corporativas - como, intimamente ligada a essa conversa, as opções conceptivas de Blockberry Creative para a fundação de seu ultraficcional debute por engenharia reversa -, no pragmatismo de que nem sempre a pedra de Davi é capaz de derrubar Golias.
De olho, 👁👁
GUNHELMET
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